200 dias: calor

Relatos anacrônicos de um isolamento auto-imposto.

Hely Branco
2 min readOct 2, 2020

Faz 200 dias que começou, ao menos por aqui. Muitas coisas aconteceram desde o último relato, há longínquos 45 dias. Nosso quadro político mudou, entrando numa fase de silêncio quase aterradora; a maioria das pessoas desistiu de seguir o distanciamento físico, seja pela crescente descrença na ciência cultivada por meses ou pelo esgotamento físico e mental somados ao longo de semanas voluntariamente presos em casa. A situação pode ser acompanhada em diversos portais governamentais, embora outros locais forneçam informações mais confiáveis. A meu ver, o pior foi a sucessão de tragédias ambientais sofridas.

Começando ano passado, e atingindo um novo pico (no qual ainda custo a acreditar) no último mês, o desmatamento chegou a proporções monstruosas. As perdas não são mais medidas em hectares, mas em porcentagem de área de cobertura do bioma. E segue, desenfreado. O pior: as consequências já podem ser sentidas. Poderia gastar páginas e mais páginas descrevendo o funcionamento dos biomas brasileiros, do balanço hídrico, das correntes atmosféricas e da distribuição de chuvas pela América do Sul, e de tantos outros assuntos relacionados. Ao invés disso, deixarei duas figuras, retiradas do site Clima Tempo na data de hoje; elas falam mais sobre o desastre ambiental que qualquer exposição acadêmica.

Temperaturas esperadas para o Brasil em 2 de Outubro de 2020. Fonte: site Clima Tempo.
Distribuição de chuvas esperada para o Brasil em 2 de Outubro de 2020. Fonte: site Clima Tempo.

Qual a resposta a isso até agora? Um discurso mentiroso, fraudulento e escrito com a mais profunda má-fé proferido na reunião das Nações Unidas. Das ações governamentais, apenas uma: repetidas tentativas de eliminar legislações de proteção ambiental. “Aproveitar para passar a boiada,” como disse o atual ministro. E para que passem, está sendo retirada a floresta e tudo mais que estiver pela frente.

No momento, eu temo pelo futuro. Sei que isso acabará, eventualmente. Somos uma espécie engenhosa, e conseguiremos reconstruir muitas das coisas que vem sendo destruídas. Talvez sejam necessárias décadas, senão mais, mas acredito no potencial reparador da ciência. O que me assusta é como sairemos disso; qual será nosso estado ao final de tanta tortura?

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